sábado, 22 de outubro de 2016

A maldição do Gre-Nal possível

Em 2011, o Grêmio caiu diante da Universidad Católica, sendo parte do famoso e frustrado "Gre-Nal da Libertadores" (Foto: Jefferson Bernardes / AFP Photo)
Na tarde deste domingo será disputado, na Arena do Grêmio, o Gre-Nal 411, válido pelo Brasileirão 2016 e que poderá implicar em muitas consequências chave na sequência dos clubes na temporada. Teremos cerca de 50 mil pessoas no estádio gremista para ver um Grêmio buscando terminar o campeonato com certa dignidade e querendo atrapalhar a vida do Internacional, que tenta se livrar de vez de qualquer risco de rebaixamento. Ambos seguem vivos na Copa do Brasil, onde no meio da semana passada alcançaram as semifinais, deixando a dupla paulista Palmeiras e Santos pelo caminho e terão pela frente os grandes de Minas Gerais, Cruzeiro e Atlético-MG.

A possibilidade de haver uma final histórica é real, o que caracterizaria o maior clássico da história. No entanto, por falar em história, ela nos conta que, sempre que estivemos diante de um Gre-Nal que pararia o Rio Grande do Sul, muitas vezes ele não aconteceu. Até hoje se fala do “Gre-Nal do Século”, disputado em fevereiro de 1989, válido pela semifinal do Campeonato Brasileiro do ano anterior – graças ao formulismo vigente à época. O Internacional venceu o clássico de número 297 por 2 a 1, de virada, em um domingo calorento, dentro de um Beira-Rio com quase 80 mil pessoas, chegando à final do torneio.


Tivemos outros clássicos em competições de mata-mata, mas nenhum com a mesma importância. Destaca-se entre eles o confronto eliminatório nas quartas de final da Copa do Brasil de 1992, no qual o Internacional novamente saiu vencedor, se classificando às semifinais na competição da qual se sagraria campeão. Foram dois empates em 1 a 1, com o time colorado se classificando na decisão dos pênaltis, dentro do estádio Olímpico. Nas Copas Sul-Americana de 2004 e 2008, o Inter fez valer a regra e eliminou o Grêmio, assim como na Seletiva para a Libertadores, em 1999.

Os clássicos que a história não escreveu

E os Gre-Nais que não aconteceram? No início das competições nacionais, lá na distante década de 60 do século passado, o Rio Grande do Sul tinha apenas um representante, o campeão estadual. Somente em 1967, com a criação do Torneio Roberto Gomes Pedrosa, Grêmio e Internacional passaram a participar juntos das competições além do Mampituba. O clássico de 1989 foi o primeiro a decidir alguma situação importante – no caso, além da classificação à final daquele Brasileirão, também valia uma vaga na Libertadores de 1989.

Até então, sequer havia a iminência desse clássico arrasa-quarteirão, ainda que ambos fizessem boas campanhas, sobretudo ao longo dos anos 70, mas muitas vezes o Grêmio ficou pelo caminho e não pode evitar o tricampeonato do Internacional. Nos anos 80, a tendência se inverteu, só que sem as boas campanhas coloradas, pelo menos na primeira metade daquela década. Depois de 1989 a gangorra quebrou de vez, e, pelo menos no Brasileirão, enquanto um ia bem, o outro ia mal. Restava a recém-criada Copa do Brasil.

O Brasileirão teve disputas eliminatórias apenas até 2002, descartando a possibilidade de um duelo de vida ou morte. A Copa do Brasil teve o confronto de 1992, que marcou a exceção do Internacional, um costumaz figurante no torneio. Em 1994, o Inter foi eliminado nas quartas de final pelo Ceará, que seria derrotado na final pelo Grêmio. Os nordestinos ainda passaram pelo obscuro Linhares, do Espírito Santo, antes da decisão – ou seja, era mesmo uma oportunidade concreta de um Gre-Nal na final daquele ano.

Os pequenos desastres da era moderna

O Internacional foi eliminado em casa, para o Peñarol, dando adeus à Libertadores 2011 e a possibilidade de um clássico histórico (Foto: Reprodução / AFP)
Entre 2002 e 2013 os clubes que disputavam a Libertadores da América ficaram de fora da Copa do Brasil – 2003, 2006, 2007, 2009, 2010, 2011 e 2012 foram exemplos disto. Nos anos de exceção, mais algumas pequenas tragédias, mas isso entra na conta histórica da Copa do Brasil. Em 2013, voltamos a ter a chance de um Gre-Nal decisivo. Nas quartas de final daquela competição, Grêmio e Inter enfrentariam Corinthians e Atlético-PR, respectivamente, e estavam chaveados para um possível enfrentamento nas semifinais.

O Tricolor passou nos pênaltis pelos paulistas, mas o Colorado ficou no caminho, perdendo no gol qualificado para o Furacão, que também eliminaria o Grêmio nas semifinais. No ano passado a situação se repetiu, terminando de forma ainda mais melancólica. A dupla Gre-Nal iria enfrentar Fluminense e Palmeiras, na mesma situação de 2013 – isso que no sorteio para as quartas de final já houve a expectativa de as bolinhas colaborarem. Ambos foram eliminados, ficando a um gol cada do esperado clássico que ficou na vontade.


A situação mais bizarra aconteceu em 2011. O Internacional era o atual campeão da Libertadores da América, enquanto o Grêmio arrancou uma vaga à fórceps para a fase preliminar da competição. As campanhas de ambos os colocaram nas oitavas de final posicionados de modo a se enfrentarem, caso se classificassem. Os adversários eram o Peñarol, para os colorados, e a Universidad Católica, para os gremistas. Rivais acessíveis, na teoria...

Na prática, a expectativa se tornou uma tragédia esportiva. Em meio à decisão do returno do Gauchão 2011, houveram os confrontos na competição continental. Ambos conseguiram a proeza de perder os jogos em Porto Alegre, o Grêmio na ida, e o Inter na volta, e o clássico pela Libertadores virou lenda urbana. Para 2016, a expectativa é maior que das outras oportunidades, em que pese o momento não tão brilhante dos times. Serão duas quartas-feiras que poderão encher o Rio Grande do Sul de dinamite – ou de lamúrias, novamente.

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Reaprendendo a sonhar



A primeira semana de outubro, quando formos fazer uma retrospectiva da dupla Gre-Nal em 2016, ficará marcada com a semana da retomada da esperança dos torcedores. Quando as expectativas já eram as piores possíveis, dentro e fora de campo armaram-se reviravoltas que permitiram uma revisão de objetivos. Tudo bem que são prêmios de consolação, longe, muito longe da grandeza de Grêmio e Internacional, mas indicam o começo da salvação de uma temporada que tinha tudo para terminar de forma trágica. Na verdade o risco ainda existe, mas só quem pode respirar aliviado na hora de dormir sabe o valor que isso tem.

Jaílson foi o autor do gol que manteve o Grêmio na briga por uma vaga na próxima Libertadores da América (Foto: Tiago Caldas / Lancepress)
Da briga pela liderança ao meio da tabela. Sem escalas, em um processo rápido e doloroso, que pulveriza os anseios até do mais otimista. O mês de aniversário do Grêmio ficou para trás com apenas uma mísera vitória em cinco jogos pelo Brasileirão, com direito a lambadas inesquecíveis sofridas para Coritiba e Ponte Preta. O comando técnico mudou e a visão sobre o futebol também, com a chegada de Renato Portaluppi, ídolo-mor da história gremista. Esqueçam aquele time acadêmico, que tocava a bola incansável e infinitamente. O “velho-novo Grêmio” busca ser sólido, vertical e reativo, características históricas do clube.

A estreia de Renato foi pela Copa do Brasil, na desnecessariamente dramática classificação gremista sobre o Atlético-PR, quando o time foi derrotado no tempo normal e venceu apenas nos pênaltis. Naquela noite já se notava um Grêmio nem melhor, nem pior, apenas diferente. Na sequência, vitória sobre a Chapecoense, em atuação pobre e eficiente, um pouco mais seguro na defesa, menos dinâmico e mais letal. Ao menos o time voltava a vencer no Brasileirão, deixando para trás uma sequência de 7 jogos sem sentir o gostinho dos 3 pontos. Apresentando visível evolução, o Grêmio superou o Palmeiras no jogo de ida das quartas de final da Copa do Brasil, fechando setembro com mais uma vitória.

Outubro começou com uma novidade vinda do Paraguai. A Conmebol anunciou que a Libertadores da América passará a ser disputada durante a maior parte do ano, já em 2017, aumentando o número de clubes e de vagas para os brasileiros. Ou seja, da noite para o dia as 4 vagas via Brasileirão se transformavam em 6, e alguns times, que pareciam à passeio no campeonato, voltavam a ter ao menos alguma motivação para terminar o ano de forma mais digna. Entre eles o Grêmio, que se arrastava em uma melancólica espera pelo final do ano, enquanto tentava a sorte na Copa do Brasil, derradeira chance de título ainda nesta temporada.

O começo dessa nova luta foi inglório, em jogo onde o time tinha que jogar pela dignidade, além de jogar pelo resultado, envolto na desconfiança de que entregaria para o Cruzeiro visando a prejudicar o Internacional. A postura foi boa, a atuação foi ruim, e o Grêmio perdeu pelo placar mínimo no Mineirão – onde não vence a Raposa desde 1998. Nesta quarta-feira, mais uma situação do mesmo tipo, desta vez para enfrentar o Vitória, em Salvador. Novamente o time se comportou bem e, apesar de perder um caminhão de gols, saiu vitorioso, se colocando na porta do recém-inaugurado G-6.

Matematicamente falando, hoje são necessários 59 pontos para garantir uma vaga na próxima Libertadores. Está muito longe do que time e torcida ambicionaram em boa parte do campeonato, mas, como costumo dizer, é muito melhor estar na “competição mais charmosa das Américas” do que não estar. O próximo jogo é um confronto direto, contra o Atlético-PR, na Arena, onde vencer é mais que importante, é vital para a manutenção deste objetivo. Volto a dizer, a vaga na Libertadores não era exatamente o que queríamos, mas se é o que podemos, vamos atrás dela.

Danilo Fernandes pega o pênalti de Juan, em momento que poderá se tornar emblemático na história do Internacional (Foto: Ricardo Duarte / SC Internacional)
Cerca de 70 mil pessoas estiveram no Beira-Rio entre o último sábado e esta quinta-feira. O apoio do povo que veste vermelho era fundamental para que os aparelhos do Internacional seguissem funcionando bem, para deixá-lo respirando no Brasileirão. Todos dentro do clube encararam os jogos contra Figueirense e Coritiba como finais de Copa do Mundo, a torcida fez sua parte e o time voltou a vencer duas partidas seguidas, o que não acontecia a quase 4 meses, quando o Inter recebeu e bateu América e Atlético numa dobradinha de confrontos contra mineiros.

O risco de rebaixamento ainda é eminente, a pontuação colorada é a mesma do Cruzeiro (33 pontos), primeiro clube dentro do Z-4 e que tem um jogo a menos. Falta muito para o torcedor poder comemorar a permanência na Série A, mas a possibilidade disto acontecer passava diretamente por esses últimos 5 dias. Alguns resultados paralelos teimavam em não ajudar, mas finalmente o Inter se ajudou. Podem não ter sido as atuações dos sonhos, mas vencer já faria o sono dos colorados ficar mais tranquilo. Até o próximo sábado, a zona de rebaixamento faz parte do passado.

Dizia após a vitória do Inter sobre o Figueirense que a tônica dos jogos entre clubes ameaçados era a baixa qualidade técnica. Pudera, no nível de tensão em que os clubes na linha entre a 12ª e a 18ª posição estão, qualquer encontro entre eles tende a pegar fogo. O jogo contra o Coritiba não poderia ser diferente. Com mais cara de time do que vinha tendo, a equipe treinada por Celso Roth seguiu esbarrando forte em suas limitações e fazendo muita força para jogar. Os paranaenses, depois de se defenderem o primeiro tempo inteiro, se soltaram na etapa complementar, inclusive ameaçando o gol de Danilo Fernandes.

Um detalhe definiu o jogo: a competência. Na parte final do jogo, Inter e Coritiba tiveram pênaltis a seu favor; Juan parou no goleiro adversário, enquanto Vitinho marcou o gol de mais uma sofrida vitória do Internacional. O Inter venceu as suas duas finais de Mundial, mas não empolgou, tampouco jogou bem. A tabela é bem indigesta até o final do campeonato e este nível de atuação deverá garantir fortes emoções ao torcedor até a última rodada. Com o equilíbrio vigente na parte de baixo da tabela, 44 pontos devem salvar os desesperados. Enquanto isso, aos colorados só resta torcer para que o pesadelo acabe de uma vez.

domingo, 2 de outubro de 2016

Angústias de um sábado à noite

O Inter pediu e o torcedor atendeu: quase 35 mil pessoas apoiaram o time do início ao fim na vitória sobre o Figueirense, em pleno sábado à noite (Foto: Ricardo Duarte / SC Internacional)
Na maioria das vezes em que me proponho a escrever aqui no Vida Cancheira é para falar sobre futebol, mas sempre colocando uma pitada de sentimento, até porque normalmente falo sobre Grêmio e é impossível me tirar do papel do torcedor frequentador da arquibancada. Nesta noite de sábado estive em um papel de relativa neutralidade. Fui convidado para assistir a Internacional e Figueirense junto a dois amigos torcedores colorados e, mesmo ciente da situação delicada que vive o clube do Beira-Rio, aceitei o convite.

A maioria das pessoas que me conhece sabe que sou um gremista um pouco fora do convencional. Embora fanático, interessado e envolvido com muitas questões do clube, não carrego comigo esse sentimento “anti-colorado” que a imensa maioria carrega consigo – e cuja recíproca é verdadeira. Minha família é inteiramente torcedora do Internacional, muitos dos meus melhores amigos também, e eu definitivamente não conseguiria me sentir feliz com um eventual rebaixamento do clube. Claro, não vou ser hipócrita, quando as situações envolvem grandes títulos é óbvio que torço contra. Mas sei muito bem o que os colorados estão passando, de abrir os jornais e ver a posição desconfortável em que seu time se encontra. Ou seja, tinha plena consciência de que a vitória era vital para o Internacional.

Costumo dizer que as demandas dos clubes no Brasileirão são definidas a partir da rodada 28, na qual estamos, pois a partir daí faltarão apenas 10 jogos para o final do campeonato, a chamada reta final. Já a alguns jogos a prioridade colorada é fugir da zona de rebaixamento, o que não aconteceria neste sábado, seja como fosse. Mesmo assim a torcida pegou junto, em um sábado à noite estranhamente frio do início de outubro, véspera de eleições, entre outras situações. Eu dizia para meus anfitriões algo que já disse aqui no blog, que o torcedor só frequenta o estádio quando o time enche os olhos, ou quando ele precisa do torcedor. Mais do que nunca, ao longo dos seus 107 anos de história, o Internacional precisa do apoio de seu povo, seja nas arquibancadas, seja com energias positivas para os jogadores.

Até no aspecto institucional o Internacional encarava o jogo como um dos mais importantes dos últimos anos, usando até a comparação com uma “final de Mundial”. Uma inglória decisão, e devemos concordar que esta analogia foi extremamente infeliz, mas necessária, para mobilizar jogadores e torcedores. Falando sobre o que aconteceu dentro das quatro linhas, o Internacional venceu por 1 a 0, gol do reabilitado Vitinho, logo no início da partida. O jogo foi fraco tecnicamente, como vem sendo a tônica dos duelos entre os times da parte de baixo da tabela do Brasileirão. Os comandados de Celso Roth pareciam muito mais preocupados em não cometer erros que pudessem proporcionar oportunidades para os catarinenses do que em matar o jogo e tranquilizar o torcedor de uma vez.


Estar em meio a muitos e angustiados colorados me fez pensar bastante durante o jogo, sobre como o futebol mexe com o torcedor. Ver o olhar de preocupação em todos e saber que, em meio a tantos problemas mais sérios que temos, o momento do time do coração ajuda a tirar o nosso sono de uma forma absurda. Nem entro nas questões de merecimento ou torcida por uma queda ou não do Inter, ou de qualquer outro time, é muito mais um lance conceitual, do quanto isso nos afeta. Na volta para casa encontrei dois torcedores colorados, na parada do ônibus, e troquei algumas palavras com eles, sobre coisas do ambiente do estádio. Absorver esse sentimento, sem compartilhar dele, é uma das coisas mais loucas do futebol. Por isso o futebol é o esporte mais popular do mundo, por isso move fortunas e multidões.

A vitória colorada não foi definitiva, e nem seria. Mas o clima que a torcida criou antes, durante e depois do jogo tende a reanimar o grupo de jogadores para tentar livrar o clube do pior. Na quinta-feira o Inter tem mais um jogo-chave para sua sobrevivência, quando receberá o Coritiba, outro concorrente direto na luta para fugir do Z-4. A frieza dos números é implacável, o Internacional segue na 18ª colocação, a 3 pontos do primeiro time fora da linha de rebaixamento e a briga deverá ser ferrenha até as rodadas finais. A lição que fica é que nos momentos ruins que o clube – seja ele qual for – deve olhar para o torcedor de verdade, aquele que abre mão de muitas coisas para estar ao lado do seu time, apoiando-o de forma incondicional. Que o Inter aprenda e traga o povo para seu lado enquanto ainda há tempo.